Me sentir livre

3 de jun. de 2019


Nasci dentro de uma família evangélica (pais pastores), tradicional e ser diferente disso nunca foi uma opção. Desde pequeno foi constantemente ensinado o erro que era qualquer coisa que fugisse do padrão de afetivo "homem & mulher". Foi difícil para mim conviver com algo que não compreendia, a homossexualidade não fazia parte do meu mundo, mas naquela mesma época via os meninos e olhava com uma perspectiva diferente dos meus amigos – inclusive não me sentia parte do grupo dos meninos, porque gostava de falar sobre coisas que “não-são-de-menino".



Comecei a me perceber mesmo como a princesa que sou mais ou menos aos 12 anos, quando meus amigos começaram a falar de garotas e relacionamentos, enquanto não me via com menina nenhuma. Aos 13 eu pedi uma amiga minha em namoro, na tentativa falha de me curar dessa “doença” e voltar a ser “normal”. Foram dois anos de sofrimento, onde chorava horrores no meu quarto pensando que realmente existia um problema.



Por volta de um ano e meio fiquei dentro de processo depressivo intenso e recluso, perdi 24kg e não fazia mais absolutamente nada além de trabalhar e chorar no meu quarto – pensando ser um erro total. Senti inveja dos meus primos héteros e da vida que levavam, senti inveja da minha irmã que era da igreja e a filha favorita dos meus pais, enquanto eu era a aberração.

Após uma longa pausa, até os 17 anos, percebi que era o momento de encarar o fato de que sou gay e que isso sempre me pertenceu – não existe nada de errado em ser quem eu sou. Então contei para duas amigas sobre mim, uma delas é a Julia, que foi a primeira pessoa a saber. Após isso fui me liberando aos poucos, conhecendo outros garotos e começando a me envolver.

Um ano depois, com 18 anos, meus pais descobriram. Esse momento que me marcou muito, pois nunca cogitei a hipótese de ser tão maltratado pelos meus próprios pais – isso, na época, quebrou toda essa confiança que tinha adquirido aos poucos comigo mesmo.
Um dia me abri com uma amiga em relação a minha sexualidade e sobre como eu me sentia – que foi muito doloroso porque precisei aprender a me abrir totalmente do zero para alguém. Ela me fez ter uma perspectiva totalmente diferente sobre o que estava acontecendo, me mostrou que o erro nunca foi eu, que sempre tentei ser filho/amigo/primo/irmão perfeito e que o fato de ser diferente deveria me agregar mais valor e não me tornar um monstro.

Percebi que não havia motivos não me desmerecer em nada e que sou maravilhoso apenas do jeitinho que eu sou. Hoje percebo que duas coisas que salvaram minha vida em relação a isso, primeiro foi a minha amizade com Julia e Luiz (meu primeiro amigo gay 120% bem resolvido consigo mesmo, um exemplo muito foda para mim) e a série que assisto desde novinha que é GLEE (aborda muito a aceitação da própria durante a adolescência, mesmo que hoje pareça uma série besta, na época foi importante para mim, pois me identificava e me dava a esperança de que poderia ser feliz do jeito que eu sou).



Hoje estou plena, bem resolvida, tranquila. Minha sexualidade não é mais nenhum tabu ou preocupação para mim – é algo que me orgulho bastante. Faço questão de ser como eu sou, não me mudaria nem mesmo se tivesse a oportunidade.


Livre/adj/
1. que é senhor de si e de suas ações. "l. para decidir" 2. que não está sob o jugo, que não é escravo de outrem.


Fotografia: Igor Medeiroz

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